Mais uma vez a
cafeicultura no Brasil chega a uma situação crítica. O preço da saca do
café despencou nos últimos anos e, hoje, o produto é comercializado
novamente abaixo do custo de produção. Cenário preocupante que prejudica
diretamente a economia regional, principalmente de Três Pontas.
Produtores, comerciantes e cooperativas buscam alternativas para superar
o mau momento. Mas o que se observa nos discursos é que enquanto não
existirem políticas públicas efetivas, dificilmente o setor produtivo do
café estará livre desses altos e baixos que estrangulam o
desenvolvimento do agronegócio no país.
Na última segunda-feira (25), representantes de vários segmentos
da cafeicultura estiveram reunidos em Varginha. O objetivo era finalizar
o documento elaborado inicialmente por lideranças políticas, sindicatos
de produtores do Sul e Sudoeste de Minas. Em seu conteúdo, linhas de
ação para tentar sensibilizar o governo Federal para o atendimento de
reivindicações emergenciais para o setor.
Para o presidente da COCATREL (Cooperativa dos Cafeicultores da Zona de
Três Pontas), Francisco Miranda Figueiredo Filho, a solução para o caso
ainda está longe de acontecer. “As políticas para o setor tem sido
feitas, mas os resultados ficam longe do esperado. Observamos que nesse
atual governo, todas as decisões políticas passam pelo Ministério da
Fazenda, seja ela de qual área for. O Ministério da Agricultura tem até
se empenhado, mas a decisão final sempre cabe ao Ministério da Fazenda e
ao Conselho Monetário Nacional. E essa decisão é de uma burocracia
muito grande. E no caso do setor do café, precisamos de decisões
rápidas”.
Francisco ressalta que a forças políticas do estado de Minas Gerais
devem se unir para buscar melhorias para o setor cafeeiro. “Precisamos
de toda bancada mineira pressionando o governo Federal. Seja Diego
Andrade, seja Carlos Melles, seja Clésio Andrade, seja Antônio Carlos
Arantes, seja Mário Henrique Silva, seja Odair Cunha, seja Silas
Brasileiro (ex-deputado), seja Geraldo Tadeu, em resumo, não vou citar
mais nomes, mas quero dizer que seja ele deputado Estadual ou Federal,
tem que ter compromisso com a agricultura. E deputado Estadual de Minas
Gerais que não tem compromisso com o café, não sei que tipo de política
está fazendo então”.
Segundo o presidente da COCATREL, o governo Estadual também deve ocupar
seu espaço nessa luta. “Minas Gerais é o estado maior produtor do café
tipo arábica do país, com produção na casa de 75%. Por isso é preciso
uma política de valorização dessa bebida, assim como o Espírito Santo
faz para valorizar o café tipo conilon. O arábica é o melhor café do
mundo. Não queremos acabar com o conilon, mas o arábica tem perdido
mercado. E cada um deve ocupar seu espaço. Vejo o governo estadual na
obrigação de ajudar os produtores de arábica”.
Com a queda no preço da saca de 60 Kg de café para patamares abaixo de
R$300,00, nem o mais otimista dos produtores analisa com bons olhos o
futuro. Porém, as lideranças do setor não deixam de ter esperança.
“Claro que nós, à frente de uma cooperativa como a COCATREL, não podemos
ter uma perspectiva de fracasso. Temos sempre que ter o pensamento
voltado para o sucesso. Porém, temos que ser realistas. E para essa
safra que se encontra estocada, não vejo muita chance de apoio
governamental. Sinto que o governo irá propor alguma inovação para a
próxima safra, como dinheiro para estocagem, dinheiro para um possível
teto e dinheiro para um programa de opções”, disse Francisco.
Entre algumas medidas que podem surtir efeito em curto prazo para
a cafeicultura, o presidente da COCATREL cita o fato do governo já ter
revisto o preço de negociação do café para com a iniciativa pública.
“Hoje, o valor está na casa de R$260,00. Mas, vai passar para
aproximadamente R$340,00. E isso facilita algum tipo de negociação
futura. Pelo menos o governo entendeu e colocou esse preço de referência
próximo ao preço de custo”.
Prejuízo para economia na casa de R$1,8 bilhão
Quando se fala na crise que atinge o agronegócio café, muitas pessoas
que não dependem diretamente do produto costumam não se preocupar. Mas
engana-se quem pensa não estar sendo prejudicado. No cenário
microeconômico do Sul de Minas Gerais, onde o café é a base na economia
de muitos municípios, a redução na geração de empregos no campo e a
falta de remuneração do produtor causam impacto negativo na economia.
É o que explica o presidente da COCATREL. Francisco comenta que hoje o
produtor da região é muito tecnificado. E por isso consegue alta
produtividade por hectare plantado. Entretanto, o preço praticado no
mercado desestabiliza o cafeicultor. “Temos cafés produzidos em áreas
planas e áreas de montanha. Acredito que hoje, nesse preço na casa de
R$300,00, o produtor tem que ser muito eficiente para empatar com os
custos de produção. Mas na realidade, a maioria trabalha no vermelho”.
E ao trabalhar com prejuízo, o cafeicultor não gera renda para economia.
Em uma conta simples, pode-se calcular, aproximadamente, o quanto de
dinheiro deixa de circular apenas na economia do Sul de Minas com essa
crise na cafeicultura. Segundo Francisco Miranda, a região produz em
média 12 milhões de sacas de café. Com a desvalorização da saca na casa
de R$150,00, basta multiplicar esse valor pela quantidade média
produzida. Obtém-se a marca de R$1,8 bilhão a menos de dinheiro em
circulação. “É uma quantia significativa a menos de dinheiro circulando
na economia. O produtor acaba sendo o maior prejudicado, pois tira sua
renda direto da lavoura. Mas no final, todos os segmentos da sociedade
saem prejudicados também. Não se esquecendo do próprio poder público que
enfrenta uma queda na arrecadação”.
Marcos Vinícius Garcia e Marcos Aurélio Fernandes Garcia
Marcos Vinícius Garcia é engenheiro agrônomo e gerente comercial
da empresa Minas Agrícolas, que revende defensivos agrícolas. Seu ramo
de atuação é diretamente ligado à cafeicultura. E em partes, a baixa no
preço do café tem influenciado nas vendas. “Nota-se que produtor de café
não deixa de aplicar os tratos culturais. Mas diminui a frequência de
realização dos mesmos. Se antes eles faziam quatro adubações, passam a
fazer três ou substituem alguns produtos com base em orientação
técnica”, explicou.
O gerente comercial disse que a procura por insumos continua. “O que a
gente percebe é que os produtores nesse período de baixa do preço do
café têm procurado alternativas diferentes para pelo menos conseguir
terminar os tratos culturais. O número de consultas e solicitação de
orçamentos em nosso ramo de produtos pós-patentes aumentou muito. E
nossos produtos, com preço melhor, vem em boa hora, pois entram para os
produtores como parte da redução dos custos de produção que hoje é
medida necessária”.
Para o gerente administrativo-financeiro da empresa, Marcos
Aurélio Fernandes Garcia, hoje o mercado oferece muitas opções para
aqueles que buscam realmente reduzir os custos de produção. “Nós
esperamos ainda um aumento de vendas para o segundo semestre,
principalmente para o segmento de produtos pós-patente. Somente o Brasil
não trabalhava com esses produtos por pressão das grandes
multinacionais. O mundo inteiro já trabalha assim, baixando custos de
produção e garantindo os mesmos resultados”.
PRODUTORES INCOMODADOS COM A SITUAÇÃO DO MERCADO DO CAFÉ
A queda no preço da saca de café nos últimos meses tem tirado o sono dos
produtores. E tomar algumas medidas torna-se necessário para que o
produtor sobreviva no mercado. Reduzir custos de produção e procurar
alternativas de comercialização do produto são ações cada vez mais
exploradas. Mas o produtor também se preocupa com o peso que ele
representa na cadeia econômica da região. E já teme pela crise que
persistirá durante a colheita que se inicia daqui a dois meses, que
prejudicará diretamente a geração de empregos e a manutenção nas
lavouras.
Acompanhe alguns depoimentos:
Raul Carvalho Guimarães (Engenheiro Agrônomo e Cafeicultor)“A situação do produtor hoje é complicada. Não temos boas expectativas para o início da safra, pois o produtor está sem saber como ficará o preço. O mercado está totalmente no escuro. Ninguém sabe que decisão tomar, pois é impossível determinar o preço da saca. Observamos hoje que o preço do café tipo 6/bica corrida, está na ordem de R$290,00 a R$320,00 a saca, e está aquém do custo de produção. Então o produtor deixa de investir em maquinários e até mesmo nos tratos culturais, o que diminui a produção futura”.
Lucas de Oliveira Lopes (Cafeicultor)“Essa queda do preço da saca nos últimos dois anos na nossa região tem sido preocupante. Para o produtor, a preocupação começa já na contratação da mão-de-obra, que é muito cara, e segue com os cuidados da lavoura, já que não houve queda de preço dos insumos. Dificilmente os produtores vão conseguir oferecer os tratos culturais corretos às lavouras. E o que mais preocupa é o fato do produtor hoje pagar para produzir. É impossível produzir uma saca de café por menos de R$330,00. Vejo que muitos produtores de montanha, que não tem condições fazer a colheita mecanizada, vão acabar com essas lavouras, pois ele será obrigado a diminuir a contratação de mão-de-obra, por não poder pagar uma remuneração apropriada aos trabalhadores. A conta hoje para o produtor não fecha. A situação da cafeicultura está complicada e mais uma vez ela pede socorro”.
Sérgio Miranda Tavares (Supervisor de Negócios no ramo de Defensivos e Cafeicultor)“No final de 2011 e início de 2012 o café atingiu preços bons, na casa de R$540,00/saca. Mas muitos produtores não venderam o produto, pois estavam com a safra comprometida. Outros guardaram o café ou obtiveram financiamentos esperando um melhor preço. Mas o mercado não correspondeu. Para 2013, ainda fica a esperança de que o preço vai melhorar. Não sabemos quando, mas alguns pontos nos indicam isso, como o baixo estoque dos exportadores, principalmente de café arábica. E vale lembrar que a alta do preço do café em 2011/2012 aconteceu durante o início da safra. Enquanto isso cabe ao produtor buscar maneiras de controlar e reduzir os custos de produção, o que infelizmente a maioria ainda não faz. E também procurar alternativas para comercializar o produto. O produtor tem que entender que não precisa ter o café em sua forma física para negociá-lo. Existem mecanismos para comercializá-lo antecipadamente. Eu mesmo costumo comercializar cerca de 30% da minha produção na forma de CPR (Cédula de Produtor Rural) ou venda a termo e assim consigo valores melhores no mercado”.
Gilberto Vilela Reis (cafeicultor)“É o pior momento da cafeicultura. Em plena entressafra o preço da saca em torno de R$300,00 não paga os custos de produção. Assim, a produção futura será muito afetada, uma vez que os preços dos insumos e da mão-de-obra só sobem e o do café só diminui. O produtor terá que pensar muito e calcular todos os seus custos a fim de não passar por dificuldades nos próximos anos. Com relação aos custos da fazenda, acho que já chegamos ao limite, não há mais onde cortar despesas. As fazendas já trabalham enxutas, não há mais, como antigamente, muitos trabalhadores, desperdícios ou compras desnecessárias. Em relação à mão-de-obra, esta terá que se especializar, pois somente o trabalhador qualificado que sabe manusear corretamente e com cuidado as máquinas (tratores, derriçadeiras, implementos agrícolas, colhedeiras etc) é que terá emprego garantido e será valorizado. A minha expectativa para a safra 2013 é muito boa com relação à produção, pois o bom preço da saca de café na safra 2011/2012 e os investimentos que foram feitos naquela época estão surtindo efeito nesta safra. Mas já com relação a preços, nem mesmo os mais experientes estudiosos da cafeicultura podem falar nada com absoluta precisão uma fez que quem determina o preço do café são terceiros e não o produtor”.
Fonte: Correio Trespontano (Texto e fotos: André Silva Rosa)
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